Alguns estudos sugerem que um em cada 10 pacientes apresenta sintomas 12 semanas após a infecção inicial pelo vírus Sars-CoV-2, causador da covid-19.
Quando Melissa Heightman criou a primeira clínica de reabilitação pós-covid-19 do Reino Unido no Hospital da Universidade College London (UCLH), no Reino Unido, em maio de 2020, ela esperava que a maior parte de seu tempo seria preenchida ajudando os pacientes a se recuperarem dos efeitos colaterais de passar várias semanas em um respirador.
Para a maioria destes pacientes, ela esperava que o caminho para a recuperação completa fosse rápido.
“No início da pandemia, não sabíamos quais seriam as sequelas de longo prazo de uma infecção por covid”, diz Heightman, especialista em aparelho respiratório.
O que ela não podia imaginar é que, um ano depois, um terço dos pacientes da clínica ainda estaria mal e, em grande parte, incapaz de trabalhar. Mais da metade nunca deu entrada em hospitais por causa da covid-19.
Quase tão logo a clínica foi aberta, Heightman começou a receber ligações de médicos locais intrigados, confusos com um fluxo repentino de pacientes — muitas vezes relativamente jovens e sem problemas de saúde subjacentes — que apresentavam sintomas crônicos.
Todas as histórias seguiam um padrão recorrente, começando com uma infecção aparentemente branda, até que uma estranha constelação de doenças começava a aparecer. Em vez de diminuir, esses sintomas continuavam a persistir por semanas e até meses depois que o vírus supostamente havia deixado seus corpos.
Era um enigma que a comunidade médica não esperava.
“Estes pacientes foram inicialmente deixados para trás”, diz Heightman.
“A maioria dos hospitais não conseguia vê-los facilmente, porque não tinha orçamento para abrir uma clínica pós-covid dedicada a isso. Mas agora eles são nosso foco principal.”
O sintoma mais comum, que Heightman diz ter sido observado em mais de 80% dos pacientes em sua clínica, é uma fadiga sufocante que atrapalha suas vidas, tornando difícil completar as tarefas diárias mais simples.
Pesquisas mostraram que a fadiga persistente está presente em pelo menos 62% dos pacientes com covid longa.
Estes casos são conhecidos agora como “covid longa”, “covid-19 pós-aguda” ou “síndrome pós-covid”, uma doença pós-viral que provou ser mais prevalente do que se imaginava inicialmente.
O consenso científico geral é que cerca de um em cada 10 pacientes com covid-19 ainda apresentará sintomas 12 semanas depois.
Mas para compreender totalmente as sutilezas dessa condição complexa, é necessário considerar que a covid longa engloba dois grupos de pacientes muito díspares — aqueles que foram hospitalizados e aqueles que não foram — cada um com diferentes causas subjacentes.
O primeiro grupo se revelou muito mais simples para os médicos administrarem.
Normalmente, seus pulmões ou coração foram danificados pela infecção viral aguda ou pela tempestade de citocinas resultante — a resposta inflamatória severa que pode fazer com que o sistema imunológico de um paciente ataque seus próprios tecidos.
A tomografia computadorizada e a ressonância magnética revelam rapidamente a extensão do dano, enquanto medicamentos como a colchicina podem ser usados para atenuar qualquer inflamação persistente nos órgãos internos.
Heightman diz que dois terços dos pacientes da clínica com covid longa que foram hospitalizados estão se recuperando bem, enquanto o terço restante apresentou melhora em seus exames após seis meses.
Sintomas
Os sintomas mais comuns incluem fadiga, névoa cerebral, dores musculares e nas articulações, distúrbios do sono, enxaquecas, dor no peito, erupções cutâneas, nova sensibilidade a cheiros e sabores e disautonomia, condição normalmente rara que causa um aumento rápido e desconfortável dos batimentos cardíacos quando a pessoa tenta desempenhar qualquer forma de atividade.
Heightman diz que enquanto 50% dos pacientes da clínica com covid longa que não foram hospitalizados melhoraram ao longo de um ano a ponto de serem capazes de gerenciar seus sintomas sozinhos, a metade restante ainda não está bem.
Embora a covid-19 seja considerada sobretudo uma doença respiratória, o vírus é capaz de infectar vários tecidos diferentes do corpo.
De 3.762 pacientes com covid longa, 77% ainda apresentavam fadiga após seis meses, 72% sentiam mal-estar após esforço, 55% sofriam de disfunção cognitiva, enquanto 36% das pacientes do sexo feminino tinham problemas com o ciclo menstrual.
“Meu próprio ciclo desapareceu por três meses”, diz Hannah Wei, parte da equipe de liderança da PLRC, que também sofreu com a covid longa no ano passado.
A pesquisa identificou que, para muitos pacientes com covid longa que não foram hospitalizados, os sintomas vêm e vão em três ondas distintas.
Da BBC Brasil